Compartilhe

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Fico muito feliz com os quase 150 mil 156 mil seguidores da Clarice Lispector no Twitter. É bom ver que a cada dia centenas de pessoas divulgam um pouco mais da escritora, mantendo assim, viva às suas palavras.

Diferente de alguns perfis que tenho visto por aí, o @clalispector publica apenas frases autênticas da escritora. Coisas que pego nos meus livros grifados, e em alguns [pouquíssimos] blogs que à homenageiam. É preciso pesquisar. Por isso às vezes a página fica desatualizada.

Você pode ajudar!
Sabe aquela frase que você anotou, grifou, tatuou? Compartilhe. Mas sem clichês, por favor.

Use os comentários, ou meu e-mail.
Abraços e obrigado,
Lucas @dreadluc
dread.luc@gmail.com

Descontinuacão

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Esse blog foi descontinuado.
Infelizmente.

Mais de Clarice em twitter.com/clalispector

Abraços.

Lucas,
dread.luc@gmail.com

Meu amor pelo mundo

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— Meu amor pelo mundo é assim: eu perdôo as pessoas terem um nariz mal feito ou terem lábios finos demais e serem feias — todo erro dos outros e nos outros é uma oportunidade para mim de amar. Veja, não permito que ninguém mande em mim, e no entanto não me incomodo por exemplo de simplesmente seguir o programa traçado na faculdade para o ensino de cada classe.

Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres, pag. 60

Faz de conta

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[...] fazia de conta que ela era uma mulher azul porque o crepúsculo mais tarde talvez fosse azul, faz de conta que fiava com fios de ouro as sensações, faz de conta que a infância era hoje e prateada de brinquedos, faz de conta que uma veia não se abrira e faz de conta que dela não estava em silêncio alvíssimo escorrendo sangue escarlate, e que ela não estivesse pálida de morte mas isso fazia de conta que estava mesmo de verdade, precisava no meio do faz de conta falar a verdade de pedra opaca para que contrastasse com o faz de conta verde-cintilante, faz de conta que amava e era amada, faz de conta que não precisava morrer de saudade, faz de conta que estava deitada na palma transparente da mão de Deus, não Lóri mas o seu nome secreto que ela por enquanto ainda não podia usufruir, faz de conta que vivia e não que estivesse morrendo pois viver afinal não passava de se aproximar cada vez mais da morte, faz de conta que ela não ficava de braços caídos de perplexidade quando os fios de ouro que fiava se embaraçavam e ela não sabia desfazer o fino fio frio, faz de conta que ela era sábia bastante para desfazer os nós de corda de marinheiro que lhe atavam os pulsos, faz de conta que tinha um cesto de pérolas só para olhar a cor da lua pois ela era lunar, faz de conta que ela fechasse os olhos e seres amados surgissem quando abrisse os olhos úmidos de gratidão, faz de conta que tudo o que tinha não era faz de conta, faz de conta que se descontraía o peito e uma luz douradíssima e leve a guiava por uma floresta de açudes mudos e de tranqüilas mortalidades, faz de conta que ela não era lunar, faz de conta que ela não estava chorando por dentro — pois agora mansamente, embora de olhos secos, o coração estava molhado; ela saíra agora da voracidade de viver.

{...} Eu queria poder pegar nela.

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Bem, mas isolada no seu canteiro estava uma rosa apenas entreaberta cor-de-rosa-vivo. Fiquei feito boba, olhando com admiração aquela rosa altaneira que nem mulher feita ainda não era. E então aconteceu: do fundo de meu coração, eu queria aquela rosa para mim. Eu queria, ah como eu queria. E não havia jeito de obtê-la. Se o jardineiro estivesse por ali, pediria a rosa, mesmo sabendo que ele nos expulsaria como se expulsam moleques. Não havia jardineiro à vista, ninguém. E as janelas, por causa do sol, estavam de venezianas fechadas. Era uma rua onde não passavam bondes e raro era o carro que aparecia. No meio do meu silêncio e do silêncio da rosa, havia o meu desejo de possuí-la como coisa só minha. Eu queria poder pegar nela. Queria cheirá-la até sentir a vista escura de tanta tonteira de perfume.

em 100 anos de perdão

Perder-se significa {...}

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Perder-se significa ir achando e nem saber o que fazer do que se for achando.

{...} entre mim e o Deus.

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"Não é que vivo em eterna mutação, com novas adaptações a meu renovado viver e nunca chego ao fim de cada um dos modos de existir. Vivo de esboços não acabados e vacilantes. Mas equilibro-me como posso, entre mim e eu, entre mim e os homens, entre mim e o Deus."


{...} O monstro sagrado morreu.

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Diga-me por favor que horas são para eu saber que estou vivendo nesta hora.

Nada mais tenho a ver com a validez das coisas. Estou liberta ou perdida. Vou-lhes contar um segredo: a vida é mortal. Nós mantemos esse segredo em mutismo cada um diante de si mesmo porque convém, senão seria tornar cada instante mortal.

Mas se não compreendo o que escrevo a culpa não é minha. Tenho que falar pois falar salva. Mas não tenho uma só palavra a dizer. As palavras já ditas me amordaçaram a boca.

Hoje é dia de muita estrela no céu, pelo menos assim promete esta tarde triste que uma palavra humana salvaria.

Abro bem os olhos, e não adianta: apenas vejo. Mas o segredo, este não vejo nem sinto. O futuro é meu enquanto eu viver. No futuro vai ter mais tempo de viver, e, de cambulhada escrever. Eu não escrevo cartas pra você porque só sei ser íntima. Aliás eu só sei em todas as circunstâncias ser íntima: por isso sou mais uma calada. Tudo o que nunca se fez, far-se-á um dia?

Vejo as flores na jarra: são flores do campo, nascidas sem se plantar, são lindas e amarelas. Mas minha cozinheira disse: mas que flores feias. Só porque é difícil compreender e amar o que é espontâneo e franciscano. Entender o difícil não é vantagem, mas amar o que é fácil de se amar é uma grande subida na escala humana. Quantas mentiras sou obrigada a dar. Mas comigo mesma é que eu queria não ser obrigada a mentir. Senão, o que me resta?

O monstro sagrado morreu: em seu lugar nasceu uma menina que era sozinha. Bem sei que terei de parar, não por causa de falta de palavras, mas porque essas coisas, e sobretudo as que eu só pensei e não escrevi, não se usam publicar em jornais.

in Tempestade de almas

{...} não sei como se escreve.

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Quando não estou escrevendo, eu simplesmente não sei como se escreve. E se não soasse infantil e falsa a pergunta das mais sinceras, eu escolheria um amigo escritor e lhe perguntaria: como é que se escreve? Por que, realmente, como é que se escreve? que é que se diz? e como dizer? e como é que se começa? e que é que se faz com o papel em branco nos defrontando tranquilo? Sei que a resposta, por mais que intrigue, é a única: escrevendo. Sou a pessoa que mais se surpreende de escrever. E ainda não me habituei a que me chamem de escritora. Porque, fora das horas em que escrevo, não sei absolutamente escrever. Será que escrever não é um ofício? Não há aprendizagem, então? O que é? Só me considerarei escritora no dia em que eu disser: sei como se escreve”

A Descoberta do Mundo .

Mas sou caleidoscópica.

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Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes que aqui caleidoscopicamente registro.



Citações

{...} fatal e inteiro.

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“Sobretudo um dia virá em que todo meu movimento será criação, nascimento, eu romperei todos os nãos que existem dentro de mim, provarei a mim mesma que nada há a temer, que tudo o que eu for será sempre onde haja uma mulher com meu princípio, erguerei dentro de mim o que sou um dia, a um gesto meu minhas vagas se levantarão poderosas, água pura submergindo a dúvida, a consciência, eu serei forte como a alma de um animal e quando eu falar serão palavras não pensadas e lentas, não levemente sentidas, não cheias de vontade de humanidade, não o passado corroendo o futuro! O que eu disser soará fatal e inteiro!.”

Perto do Coração Selvagem

Mas há a vida

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Mas há a vida
que é para ser
intensamente vivida,
há o amor.
Que tem que ser vivido
até a última gota.
Sem nenhum medo.
Não mata.

Citações

{...} Eu estava comendo a mim mesma.

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E ao quinto tambor já estarei inconsciente na minha 126 127 cobiça. Até que de madrugada, aos últimos tambores levíssimos, me encontrarei sem saber como junto a um regato, sem jamais saber o que fiz, ao lado da enorme e cansada cabeça do cavalo.

Cansada de quê? Que fizemos nós, os que trotam no inferno da alegria? Há dois séculos que não vou. Da última vez que desci da sela enfeitada, era tão grande a minha tristeza humana que jurei que nunca mais. O trote porém continua em mim. Converso, arrumo a casa, sorrio, mas sei que o trote está em mim. Sinto falta como quem morre. Não posso mais deixar de ir.

E sei que de noite, quando ele me chamar, irei. Quero que ainda uma vez o cavalo conduza o meu pensamento. Foi com ele que aprendi. Se é pensamento esta hora entre latidos. Os cães latem, começo a entristecer porque sei, com o olho já resplandecendo, que irei. Quando de noite ele me chama para o inferno, eu vou. Desço como um gato pelos telhados. Ninguém sabe, ninguém vê. Apresento-me no escuro, muda e em fulgor. Correm atrás de nós cinqüenta e três flautas. À nossa frente uma clarineta nos alumia. E nada mais me é dado saber.

De madrugada eu nos verei exaustos junto ao regato, sem saber que crimes cometemos até chegar a madrugada. Na minha boca e nas suas patas a marca do sangue. O que imolamos? De madrugada estarei de pé ao lado do ginete mudo, com os primeiros sinos de uma Igreja escorrendo pelo regato, com o resto das flautas ainda escorrendo dos cabelos.

A noite é a minha vida, entardece, a noite feliz é a minha vida triste - rouba, rouba de mim o ginete porque de roubo em roubo até a madrugada eu já roubei, e dela fiz um pressentimento: rouba depressa o ginete enquanto é tempo, enquanto ainda não entardece, se é que ainda há tempo, pois ao roubar o ginete tive que matar o Rei, e ao assassiná-lo roubei a morte do Rei. E a alegria do assassinato me consome em prazer.

Eu estava comendo a mim mesma, que também sou matéria viva do sabath.

A Paixão Segundo G.H.

E uma desilusão.

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E uma desilusão. Mas desilusão de quê? se, sem ao menos sentir, eu mal devia estar tolerando minha organização apenas construída? Talvez desilusão seja o medo de não pertencer mais a um sistema. No entanto se deveria dizer assim: ele está muito feliz porque finalmente foi desiludido. O que eu era antes não me era bom. Mas era desse não-bom que eu havia organizado o melhor: a esperança. De meu próprio mal eu havia criado um bem futuro. O medo agora é que meu novo modo não faça sentido? Mas por que não me deixo guiar pelo que for acontecendo? Terei que correr o sagrado risco do acaso. E substituirei o destino pela probabilidade.

A Paixão Segundo G.H.

Sou um dos fracos?

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Sou um dos fracos? fraca que foi tomada por ritmo incessante e doido? se eu fosse sólida e forte nem ao menos teria ouvido o ritmo? Não encontro resposta: sou. É isto apenas o que me vem da vida. Mas sou o quê? a resposta é apenas: sou o quê. embora às vezes grite: não quero mais ser eu!! mas eu me grudo a mim e inextricavelmente forma-se uma tessitura de vida.

Água Viva